No Ceará, a maioria dos 14 perímetros de irrigação implantados e administrados pelo Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) apresenta precária infraestrutura, baixa produção e, em muitas áreas, a pobreza ronda os lares dos colonos. Cada projeto tem seus problemas próprios, mas a dificuldade de irrigação, falta de assistência técnica e a precariedade de canais, de diques, de drenos, das estradas internas e a baixa produtividade é um quadro comum às áreas de produção.
Implantados a partir da década de 1970, como projeto de produção agropecuária no semiárido cearense, os perímetros, atualmente, não cumprem o seu papel. Os colonos mais antigos estão cansados e os filhos não encontram incentivos para continuarem a luta diária no campo. Muitas famílias sobrevivem de rendimentos de aposentadoria rural e há milhares de lotes ociosos.
Outro impasse é a indefinição no processo de regularização fundiária e venda dos lotes para os irrigantes. O projeto inicial previa a venda das unidades produtivas e das casas para os colonos, mas quatro décadas depois há obstáculos legais a serem vencidos. Empobrecidos, a maioria dos produtores alega não ter recursos financeiros para aquisição dos imóveis.
O Perímetro Irrigado Icó-Lima Campos, localizado na região Centro-Sul, é um exemplo de abandono e de precariedade da infraestrutura. Apenas 25% dos lotes são irrigados. O restante depende de água de poços, muitas vezes com excesso de sal e de ferro, que provoca salinização do solo.
O sistema de bombeamento está paralisado há 12 anos. A falta de condições para o pagamento do custo de energia elétrica inviabiliza o projeto inicial. Sem irrigação, 75% dos lotes têm baixa produção, estão ociosos e dependem da tradicional agricultura de sequeiro, isto é, das chuvas, para que os colonos possam colher um pouco de feijão, milho e arroz.
“A nossa situação é de desespero e de preocupação”, disse o aposentado e um dos colonos remanescentes da implantação do perímetro, Venceslau Batista, conhecido por Siqueira. “Passei dez anos sem plantar, vivendo da aposentadoria, porque não há irrigação, o canal está seco”. Há dois anos, Siqueira e a mulher, Miralva Batista, fizeram um empréstimo de R$ 8 mil, comprometendo parte da aposentadoria para perfuração de um poço. Graças ao cacimbão, a família, com a ajuda de um filho, voltou a produzir feijão.
O aposentado Siqueira, uma das lideranças dos colonos, é taxativo: “queremos comprar os lotes, mas antes o Dnocs tem de recuperar os canais, melhorar a infraestrutura e implantar o projeto de transposição das águas por gravidade para que possamos produzir e ter renda para pagar os imóveis”. Esse é o pensamento da maioria dos agricultores. “A gente veio para cá para trabalhar, mas faltam condições”, reclama o produtor, Osanir Andrade. “Aqui só irriga quem tem poço”.
O perímetro recebe água do Açude Lima Campos e por gravidade irriga 25% dos lotes, na margem esquerda do Rio Salgado. Nessa área, apesar da baixa produtividade, da falta de assistência técnica e de modernas tecnologias de cultivo, há produção e renda. As famílias têm melhores condições de vida.
O problema está nos lotes localizados na margem direita do Rio Salgado, onde o quadro é de pobreza e de lamentações. “A gente vive com a mão na cabeça e, muitas vezes, falta o que comer”, disse a dona de casa, Neliane Barros, que ajuda o marido no cultivo de cultura de subsistência na época das chuvas.
O aposentado, Manoel Ferreira Lima, colono desde 1974, luta com dois filhos, Paulo e Pedro Ferreira, para manter meia dúzia de vacas e um plantio de capim. “Estamos sem condições de trabalho porque a água do poço é pouca”, disse. “Se tivesse água no canal daria para plantar de tudo, o perímetro era lindo e a gente estava bem de vida, mas do jeito que está só dá para escapar”. O canal seco há 12 anos, que passa ao lado dos lotes, é sinônimo de tristeza e abandono. “O nosso sonho era ver isso aqui cheio de água e as terras irrigadas”, disse o produtor Paulo Ferreira.
Os números da Associação do Distrito de Irrigação Icó-Lima Campos (Adicol) mostram a baixa utilização do perímetro que tem área total de 10 mil hectares. A área irrigada é de 2,4 mil hectares, mas apenas a metade, está em operação com cultivo de culturas permanentes (fruteiras e capineiras) e temporárias (arroz, abóbora, feijão e milho).
Há uma tendência de emancipação dos perímetros, que passariam a ser administrados pelos colonos, entretanto, o Dnocs nunca concluiu o processo. “A nossa principal reivindicação ao Dnocs é a recuperação dos canais e da estrada de acesso às áreas de produção, a implantação do projeto de transposição das águas do Açude Lima Campos por gravidade e a modernização do sistema de irrigação”, explicou o presidente da Adicol, José Sebastião Ferreira. “Antes de vender os lotes, o Dnocs precisa investir recursos para recuperar o perímetro”.
Apoio
O coordenador estadual do Dnocs, Eduardo Segundo, esclareceu que o pagamento da conta de energia do funcionamento das bombas foi feito pelo órgão, durante muitos anos e que depois a responsabilidade passou para os irrigantes, quando ocorreu a inadimplência. Disse, ainda, que foi feito um estudo de transposição das águas por gravidade, um sifão sob o Rio Salgado, com custo atual orçado em R$ 11 milhões. “Esse é um valor viável e essa obra será a redenção do perímetro”, disse. “Precisamos do apoio de políticos para implantar esse projeto. Estamos nos esforçando para isso”.
Eduardo Segundo esclareceu que há uma preocupação do Dnocs com a falta de irrigação em dois terços do Perímetro Icó – Lima Campos e frisou que, de um modo geral, não há como fazer a emancipação sem que o órgão faça a restauração das obras de uso coletivo, como canais principais. “A maioria dos perímetros apresenta infraestrutura degradada. O orçamento do Dnocs é confortável, mas prevê recursos para investimento, e falta verba para manutenção, que fica a desejar”.
MAIS INFORMAÇÕES
Associação do Distrito de Irrigação Icó – Lima Campos ( Adicol)
Av. do Cruzeiro S/N, bairro Centro
Telefone: (88) 3561. 1974
Honório Barbosa/ Diário do Nordeste
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