terça-feira, 14 de junho de 2011
A arte e a tradição dos remédios medicinais em Icó
O raizeiro, rezador e poeta popular, Otacílio Holanda, de Icó, mantém viva a prática e tradição da fitoterapia na região
Icó. As plantas curam. Os indígenas e antigos deixaram para nós um legado de conhecimento popular sobre as propriedades medicinais de ervas, raízes, folhas e caules. Apesar dos avanços da indústria farmacêutica e da modernização dos costumes, o uso da fitoterapia ainda resiste e é praticado em algumas cidades do sertão cearense. Um exemplo é o raizeiro, rezador e poeta popular, Otacílio Holanda, 88 anos, que todas as semanas faz atendimento e venda de seus produtos no mercado central nesta cidade.
O doutor-raiz, Otacílio Holanda, depois de alguns anos morando nesta cidade, resolveu fazer o caminho de volta para a zona rural e encontrar tranquilidade, em uma casa no campo, ao lado de uma farmácia viva que mantém no sítio Alto da Várzea, distante 30km do Centro. Os dias de atendimento foram reduzidos de seis para dois por semana. "Estou precisando de mais sossego", disse. "A idade já pesa um pouco".
Foi no campo, ao lado do pai, o profeta popular, Sebastião Norberto, no Sítio Caranguejo, zona rural de Jaguaribe, que Otacílio Holanda, ainda criança, despertou para a cura de animais e de plantas. Lembra que aos sete anos, fazia um caminhão de talo de milho, e na carroceria do brinquedo, carregava ervas e misturas que colocava nas catingueiras. "Fica verde e folheava mais rápido", conta. "É um dom que a gente nasce com ele e vem de Deus".
As brincadeiras dos tempos de criança e adolescente, corre-corre, cavalo de pau, logo ficaram para trás, mas praticadas por outros meninos no sítio. "Meu pai era profeta popular, adivinhava se o inverno seria bom ou não, observando o tempo, a lua e planetas, a cada dia 22 dos últimos meses do ano", recordou. "Eu aprendi muitas coisas com ele, a observação e o respeito à natureza".
Deixando a medicina popular de lado, o raizeiro adverte: "Vênus trouxe carga negativa e o inverno começaria bom, mas iria fraquejar". Otacílio Holanda foi vaqueiro durante vários anos, tangendo e reunindo a boiada no sertão de Jaguaribe. Preferia a lida com o gado. "Plantei pouco, uma rocinha de milho e feijão só para comer verde".
Na atividade de vaqueiro desenvolveu o dom de cura dos animais, usando ervas e rezas. Depois, começou a atender gente. "Crianças com vento caído, diarreia, febre, quebranto, mulher com resguardo quebrado, infecção na urina e até impotência nos homens eu tratei com o uso de plantas", contou.
Otacílio Holanda cansou da vida de vaqueiro e procurou ampliar os conhecimentos sobre as propriedades medicinais das plantas por meio de leituras de revistas e livros especializados. Aprendeu fazer algumas receitas de lambedor e garrafadas e afirma que já tratou e curou muita gente "com inflamação e doenças graves".
Passou a morar em Icó onde formou clientela e montou uma banca de venda das ervas, raízes e produtos naturais, muitos oriundos do Cariri. "Comecei no mercado velho, mas de lá fui tirado por três vezes e agora me emprestaram esse espaço aqui (mercado de frutas e verduras)", contou.
Os vendedores do mercado admiram a resistência e a insistência do rezador, que mesmo aposentado e com idade avançada não pensa em parar. Alguns contam que ficaram curados com o uso de plantas. "Eu tinha uma ferida na perna e fiquei boa com uma mistura que ele preparou", contou a dona de casa, Maria Rodrigues. Maria de Fátima Ferreira, doméstica, disse: "fiquei boa de uma coceira entre os dedos dos pés".
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